A
maioria de meus parcos leitores, com certeza, nunca ouviu falar de Berry
Bennel. Tranquilos! Não há nenhum culpa nisso... Afinal, só mesmo um brasileiro
maluco por futebol poderia saber quem é esse misterioso personagem. Eu não sou
maluco por futebol. Falo dele por outro motivo que logo vocês verão, interessa
a mim e a todos.
Mas
qualquer inglês que tenha mínimas noções do esporte bretão que se joga com os
pés, sabe quem é ele. De 1982 a 1994, Berry Bennel foi coordenador e treinador
do Crewe Alexandra, clube da Quarta Divisão do Futebol Inglês. Não seria grande
coisa, mas, além disso – e o que o tornou famoso – ele também era “olheiro” do
Manchester City, do Chelsea e do Stoke City, clubes de primeira grandeza e
“sonho de consumo” de qualquer iniciante no futebol. O faro futebolístico de
Bennel em descobrir novos talentos fez com que fosse considerado o melhor
olheiro das categorias de base de toda a Grã-Bretanha. E, nessa função e com
tal fama, ele tinha acesso irrestrito a todos os garotos – a maioria de origem
pobre – que sonhavam com um futuro melhor para eles e suas famílias graças ao
talento futebolístico.
E
aí se revelou o “lado monstro” de Bennel. Aproveitando-se do acesso aos garotos
e a seus alojamentos, o treinador e olheiro construiu uma sórdida carreira de
predador sexual que tem no currículo o registro de mais de cem meninos, entre 8
e 15 anos, abusados por ele. Sua carreira de pedófilo só foi interrompida por
ocasião de uma excursão de seu time de crianças aos Estados Unidos. Longe da
proteção que os grandes times poderiam lhe dar, foi preso pela justiça
americana e condenado. Com a publicitação do fato, outras denúncias surgiram e
ele foi deportado para a Inglaterra onde foi condenado a 30 anos de prisão.
Uma
de suas vítimas, o ex-zagueiro Andy Woodward, esteve no Brasil no início de 2018
e, em várias cidades, proferiu uma séria de palestras sobre sua experiência e a
necessidade de livrar o futebol deste tipo de predador. Sua visita estava
relacionada ao escândalo que veio à tona nas categorias de base do Santos
Futebol Clube onde o também “olheiro” Ricardo Marco
Crivelli, conhecido como “Lica”, foi denunciado pelo jogador Ruan Pétrick
Aguiar de ter abusado dele e de outros dos meninos da Vila Belmiro.
Na mesma época, na Argentina, o Independiente foi palco de outro
escândalo que envolvia não apenas pedofilia, mas também prostituição de
menores. Um jogador maior de idade e um árbitro de futebol agenciavam os
atletas de base da equipe como “garotos de programa”.
Uma rápida busca na internet mostra inúmeros outros casos,
tantos nos grandes clubes como nos pequenos clubes e escolinhas de futebol do
interior onde o abuso sexual é moeda de troca para a possibilidade de inserção
e ascensão no mundo da bola.
Apesar disso tudo, não tenho notícia, até hoje, de que a todo
poderosa Sra. FIFA tenha convocado uma Assembleia Geral com os Presidentes de
todas as Confederações Nacionais de Futebol para discutir um modo de punir os
“olheiros”, treinadores, pessoal técnico e dirigentes que abusam – ou são
coniventes - dos meninos que, supostamente, estariam sob sua guarda e proteção.
E assim, pelo que parece, tais episódios continuarão a se reproduzir para a
triste sorte de nossos meninos...
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