Os fatos que lembramos e aos quais fazemos
referência em nossos discursos revelam a idade que temos. Saber o que foi a
“Tormenta no Deserto” revela que a pessoa – fora os apaixonados por história –
tem mais de cinquenta anos... É o meu caso. Estou iniciando a segunda parte
daquilo que espera seja o século que me cabe viver e por isso lembro o que foi
a “Tormenta no Deserto”.
A “Tormenta no Deserto” também marca um tempo na
minha vida e ganha com isso um significado especial. No dia 24 de fevereiro de
1991 eu deixava o Brasil para iniciar um período de trabalho na Nicarágua
pós-sandinista. Naquele exato dia, enquanto juntamente com o agora falecido
Vitor Poloni, deixava Porto Alegre nas asas da Varig e, depois de uma escala no
Equador e outra na Costa Rica, chegávamos em Manágua, as areias do deserto do
Golfo Pérsico e os céus do Oriente Médio sacudiam sob o peso da maior operação militar
desencadeada depois do fim da Segunda Guerra Mundial. Em uma única noite, as
forças de uma coalização internacional liderada pelos Estados Unidos despejaram
sobre o Kuwait e o Iraque, apenas através de bombardeios aéreos, nada mais nada
menos que oitenta e oito mil e quinhentas toneladas de explosivos.
Foi a primeira guerra televisionada ao vivo. A CNN,
então uma emergente cadeia de televisão, foi encarregada de divulgar ao mundo o
espetáculo do bombardeio. A Tormenta no Deserto foi transformada em espetáculo
e videogame. Os soldados, nos aviões ou nos bunkers de comando, apertavam
botões e os céus e cidades do Iraque explodiam num espetáculo de cores que
ocultava a morte de em torno de um milhão de pessoas.
No dia seguinte, 25 de fevereiro, por terra, a
coalização militar ocidental entrou no Kuwait e, em menos de 24 horas, já fazia
as tropas iraquianas comandadas por Saddam Hussein recuarem ao norte da
fronteira. No dia 26 o Iraque é invadido e no dia 27 um armistício é assinado.
Na retirada, as forças iraquianas incendiaram os poços de petróleo que não
haviam sido destruídos pelo bombardeio norte-americano.
Qual a causa dessa guerra? Muitas podem ser
elencadas... Cada historiador escolhe as suas e dá destaque a esta ou aquela.
Mas a causa imediata é clara: o preço do petróleo. Para poder manter a dinâmica
de sua economia, os Estados Unidos obrigavam a Arábia Saudita, os Emirados
Árabes e o Kuwait a uma superprodução para além dos limites estabelecidos pela
OPEP. Com isso, o preço do petróleo baixou de dezesseis a dez dólares o barril.
O Iraque, maior produtor da época e necessitado de divisas para reconstruir o
país após a guerra contra o Irã – guerra patrocinada do lado iraquiano pelos
norte-americanos, há de se lembrar – era o maior prejudicado com essa política.
Impossibilitado de resolver diplomaticamente seu problema, invadiu o Kuwait
como uma forma de regular o mercado petroleiro.
O Iraque pagou e continua pagando até hoje um alto
preço por essa aventura. Em 2003 sofreu outra invasão por parte dos Estados
Unidos que, desta vez, depôs Saddam Hussein sob o pretexto de armas químicas e
nucleares nunca encontradas. O território do país do Tigre e do Eufrates foi
dividido em três zonas e hoje é um dos abrigos do chamado “Estado Islâmico” que
continua a convulsionar aquela região.
Quase trinta anos depois, o mapa do petróleo mudou.
As maiores reservas conhecidas não estão mais no Oriente Médio. Novas
descobertas revelaram que o maior volume de ouro negro ainda disponível é o que
se esconde no Golfo de Maracaibo. E é o tipo de petróleo – o “petróleo pesado”
– que mais faz falta à indústria americana. E que com o embargo dos Estados
Unidos ao Irã, este petróleo, no mercado internacional, tornou-se extremamente
caro. E o disponível na Venezuela está a apenas três dias de viagem das
refinarias do Texas. Enquanto que, o importado do Oriente Médio leva quase três
meses para fazer o percurso.
O único problema é que os venezuelanos não estão
mais dispostos – como o estiveram no passado – a entregar o petróleo de graça.
A solução: uma Tormenta no Caribe. É o que talvez se aproxime. Outra vez, o problema
é o petróleo.
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