“Para quê fazer as coisas simples,
se elas podem ser complicadas?” É a pergunta que nós, que nascemos antes da era
digital, nos colocamos diante de sistemas operacionais, programas, aplicativos,
telefones, comandos eletrônicos e digitais que, ao invés de facilitar,
complicam a vida de muitos usuários. Se tomarmos os programas para edição de
texto, por exemplo, de cada cinquenta funcionalidades, um digitador normal
talvez utilize duas ou três. E olha lá!... O mesmo nos smartphones. São raras
as pessoas que utilizam sequer 10% de todas as possibilidades que eles
oferecem. Por que, então, não oferecer telefones, programas, máquinas... com os
recursos básicos e que todas as pessoas possam utilizar?
Pode haver várias razões para isto.
Mas uma é indiscutível: porque a maioria de nós trabalha com a afirmação
inconsciente de que o mais complicado é melhor. E não só no campo da
tecnologia. Também na vida prática. Se uma pessoa vai ao médico e este, após
uma consulta, não pedir nenhum exame e não oferecer uma longa lista de
medicamentos a consumir, é provável que este médico seja considerado como não
confiável. Mas se o médico pedir quatrocentos exames e disser que a pessoa tem
dez doenças com nomes impronunciáveis e mandar tomar vinte remédios, caros e com
bulas assustadoras, a pessoa muito provavelmente vai dizer: “esse médico é dos
bons”!
No mundo das religiões, a
necessidade que temos de complicar as coisas, é ainda maior. Quanto mais
exigente ou bizarra nas suas demandas e ofertas for uma religião, mais provável
é que atraia adeptos com rapidez e os mantenha convictamente ligados a essa
experiência. Ainda mais se o chefe religioso usar nomes, roupas estranhas e
tiver comportamentos bizarros.
O gosto pela complicação, de fato,
parece fazer parte da própria condição humana. Mas não nos preocupemos: desde
os tempos de Jesus era assim. Um rabino foi a Jesus e fez a pergunta religiosa
clássica: “O que devo fazer para conquistar a vida eterna?” Jesus respondeu com
aquilo que era o óbvio para todo judeu piedoso: “Observa os mandamentos”. E,
para simplificar mais ainda as coisas, Jesus lhe diz: “E não precisa observar
os dez. Basta observar os dois primeiros – amar a Deus e amar ao próximo – e
tudo o mais se resolve!” Mas o doutor em leis, que era daqueles que acham que o
complicado é melhor que o simples, logo atirou a pergunta: “Mas, quem é meu
próximo?” De fato, os rabinos judeus tinham todo um sistema complicado para
definir quem era “próximo” e devia ser amado e quem era “estrangeiro” e devia
ser odiado. Jesus sabia disso e, para manter a sua afirmação na simplicidade da
experiência da fé que pode ser alcançada por qualquer um, conta uma historinha
simples: um homem foi assaltado e atirado meio-morto à beira do caminho. Vários
passaram por ele sem fazer nada. Um samaritano passou, viu o homem caído e o
ajudou. O samaritano é próximo daquele que estava caído à beira do caminho.
Logo, o samaritano fez aquilo que é necessário para ter a vida plena e
perfeita. Simples assim!
Se o caminho da salvação é esse, por
que nossas religiões, inclusive o cristianismo, se apresentam de forma tão
complicada? Tantas leis, tantas obrigações, tantos ritos, roupas, gestos,
construções, negócios, funcionários, relicários, imposições, discussões sobre
quem é Deus e qual é a melhor religião ou a Igreja que mais salva?
Suspeito que seja pela mesma razão
que nos leva a desconfiar de máquinas, programas, softwares e telefones simples
e fácil de usar: a satisfação com o complicado é um modo de disfarçar a nossa
não disposição de fazer aquilo que é simples. Em outras palavras, complicamos
para nos descomprometer. É preciso voltar ao simples, ao “arroz com feijão”, ao
básico, àquilo que realmente nos torna humanos e nos conduz no caminho de Deus:
amar ao próximo e amar o irmão. Tudo o mais pode até ser bom. Mas não é
necessário. E pode atrapalhar o caminho da salvação.
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