Tempos difíceis os que estamos vivendo. Tão difíceis que se
tornam assustadores. Você liga a televisão e, quem aparece? O Trump e seu
topete! Você troca de canal e quem te sorri? O Putin. E todos conhecem o
sorriso do Putin: não existe. Nunca vi o Putin sorrir. Por que será? Outro
canal e agora é o eterno sorriso banqueiro do jovem recém-eleito à Presidência
da França. E aí você se pergunta: por que o Macron está sempre sorrindo?
Desconfie de quem nunca sorri e desconfie também de quem está sempre sorrindo.
Alguma coisa ambos estão tentando disfarçar com seu eterno não-sorriso ou com
seu eterno sorriso. Para não ficar só em figuras masculinas: alguém poderia me
informar se já viu a Angela Merkel sorrir? Não naquelas fotos de campanha
retocadas por sofisticados programas. Numa situação real, alguém lembra de um
sorriso da Merkel?
Cansado de notícias internacionais? Pense nas nacionais. É
ainda mais assustador. Procuradores vendendo palestras onde prometem revelar de
primeira mão informações obtidas através de confissões forçadas. Juízes
absolvendo ou condenando não na base de provas, mas de convicções. Deputados e
senadores fazendo leilão de seu voto a favor ou contra a cassação de um Presidente
ilegítimo que apresenta como principal conquista de seu efêmero governo o
aumento do desemprego. E esse mesmo que se faz passar por Presidente comprando
votos daqueles que não querem vê-lo cair porque a instabilidade lhes é
favorável. São deputados profissionais. Eles são cascudos e sabem que, em rio
que tem piranha, jacaré nada de costas. Partidos que afirmam que sua diferença
consiste em roubar sem ser flagrado na ilegalidade. Sindicalistas defendendo
uma reforma trabalhista que faz os trabalhadores voltarem à condição de
escravos. Talvez sonhem em serem promovidos a capitão-do-mato. É um progresso
prá trás. Um vereador negro da maior cidade do país furioso porque a
universidade mais elitista do Brasil aderiu ao sistema de quotas econômicas e
raciais. Empresários que defendem a eficácia da iniciativa privada enquanto se
locupletam com o dinheiro roubado do erário público. A polícia agenciando e
armando ladrões e traficantes. E, na base de tudo, eleitores que reclamam da
corrupção dos políticos enquanto buscam um vereador, deputado, prefeito ou
governador para conseguir uma vaga para seu filho no serviço público, na
universidade, no hospital...
Em meio a tudo isso fui convidado para, num final de semana,
assessorar um encontro de uma pequena congregação de Vida Religiosa no interior
de São Paulo. Congregação nova, aprovada há pouco mais de 50 anos. Ostentam o
sugestivo nome de “Filhos da caridade” os homens e “Filhas da caridade” as
mulheres. Os religiosos e religiosas são poucos. A maioria do grupo é composta
de leigos e leigas que vivem o carisma da Congregação. Além de paulistas de várias cidades, há
também cariocas e maranhenses. Há uma senhora que anda apoiada numa bengala.
Homens e mulheres já de cabeça branca. Mas também um grupo significativo de
jovens com toda a energia da idade. Negros e brancos. Alguns apenas
alfabetizados. Outros com curso superior. Casados e solteiros. Trabalhadores e
trabalhadoras de vários segmentos e micro e pequenos empresários. E, para
aumentar a diversidade, argentinos vivendo no Brasil, um irmão religioso provindo
da Tanzânia, outro da Itália, da Índia, das Filipinas e do Timor Leste. E aí a
Língua Portuguesa se mistura com o Espanhol, o Inglês, o Italiano, o Tetum, o
Suaíli, o Malaio... Pluralidade total! E todos e todas se entendem ao falar a
linguagem comum da caridade no desejo e no
compromisso de servir aos mais pobres e necessitados em cada distinto lugar em
que vivem. Jovens desempregados na Itália, doentes e anciãos na Tanzânia,
órfãos na Índia, feridos na guerra do Timor, moradores de rua nas Filipinas,
jovens em situação de risco no Brasil.
Um pequeno sinal, uma pequena experiência.
Minúscula, ínfima, invisível na própria cidade em que acontece e que não aparecerá
em nenhum noticiário. Mas um sinal, sim, de que um novo mundo é, sim, possível!
Sinal de uma Vida Religiosa profética que continua a testemunhar o sonho do
Reino de Deus. E sonhar, mais do que nunca hoje, é preciso! Pois sonhar, é o
único caminho para sair do pesadelo mundial e nacional que estamos vivendo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário