O nome é bonito: terraplanista!
Uma espécie para mim nova. Tomei conhecimento dela lendo uma reportagem no site
da BBC. Curioso, comecei a fazer buscas na internet e me dei conta que há
vários grupos deles que se multiplicam pela internet. Alguns ultrapassam o
número dos 70 mil seguidores. Entre eles, pessoas com boa formação acadêmica: técnicos,
engenheiros, profissionais de várias áreas. Também há muitos estudantes
universitários e até alguns professores. Para minha surpresa, um dos grupos
mais ativos tem como administrador um morador da capital dos pampas.
A afirmação dos terraplanistas é
simples: a Terra é plana e seus confins são delimitados por uma cúpula na qual
circulam o sol, a lua e as estrelas que seriam muito menores que a Terra. O
objetivo dos terraplanistas é combater os “globalistas”, ou seja, aqueles que
acreditam que o planeta Terra é redondo.
Por consequência, os
terraplanistas também se opõem aos heliocentristas. O terraplanista é geocentrista. Copérnico, para eles, foi um
mentiroso. Galileu Galilei, idem. A Igreja fez bem em condená-los. Como
argumento para a sua teoria, citam as muitas tradições religiosas que afirmam
que a Terra é o centro do universo. Entre elas, a Bíblia. Para um terraplanista,
a teoria de que a Terra é redonda nada mais é do que uma conspiração de pessoas
antirreligiosas e da Agência Espacial Norte Americana (a NASA) que com isso
pretende ganhar dinheiro e manter a humanidade sob sua dominação. As fotos de
satélite mostrando a Terra redonda seriam uma montagem para enganar os
incautos. Mais: a própria existência de satélites girando ao redor da Terra
seria pura mentira, como mentiroso foi o desembarque do ser humano na Lua.
Ao seguir um grupo de
terraplanistas, me dei conta que muitos deles são também criacionistas. Eles
acreditam que o ser humano, assim como todos os animais e as plantas, foram
criados por Deus assim como são na atualidade. E que a criação deu-se tal qual
está descrito no Livro do Gênesis da Bíblia cristã. No primeiro dia Deus
separou a luz da trevas; no segundo as águas as águas superiores das águas
inferiores; no terceiro separou as águas inferiores da terra e nesta criou as
ervas; no terceiro o sol, a lua e as estrelas; no quinto, foi a vez dos animais
aquáticos, das aves e dos répteis; no sexto Deus criou os animais terrestres e,
entre eles, os humanos sobre os quais soprou seu alento divino. A Teoria da
Evolução das Espécies, para os criacionistas, nada mais é do que uma das tantas
invencionices da modernidade e suas ciências na tentativa de semear a descrença
e o ateísmo. Os fósseis, tanto animais como humanos, encontrados em diversos
lugares do mundo, são apenas grosseiras invencionices para ludibriar bobos.
Outro elo entre terraplanistas e
criacionistas, é o chamado negacionismo. Muitos deles negam veementemente que
seis milhões de judeus tenham sido mortos pelas forças armadas, pela polícia e
pelos diversos grupos paramilitares nazistas alemães no período que antecedeu e
durante a II Guerra Mundial. E, assim como não houve o holocausto dos judeus,
também não houve perseguição e morte de comunistas, ciganos e homossexuais. Os
campos de concentração e extermínio seriam invenção dos próprios judeus,
comunistas, ciganos e homossexuais para se passarem por vítimas e assim
conquistar indenizações e humilhar o povo alemão. Hitler, para os revisionistas
– muitos deles criacionistas e terraplanistas – foi um grande governante que
reergueu a nação alemã que vivia humilhada pelas forças do imperialismo
capitalista e comunista. A prova é que os dois imperialismos se uniram para
derrotar a nação alemã. Mas o IV Reich um dia se reerguerá para restabelecer a
supremacia da raça ariana sobre toda a humanidade.
Entre os terraplanistas,
criacionistas e revisionistas, especialmente os do sul do Brasil, há muitos que
afirmam que as obras de arte devem ser censuradas. Quando eclodiu o episódio da
exposição “Queermuseum” do Santander, vários se pronunciaram afirmando que
aquilo não era obra de arte. Para eles, o próprio conceito de “queer” é algo
que vai contra a natureza já que, pela criação de Deus, ou se é macho ou se é
fêmea. E que as pessoas que se afirmam gays, lésbicas, bissexuais, transexuais,
transgêneres..., nada mais são do que aberrações fruto da ideologia de gênero
semeada pelas forças internacionais imperialistas que pretendem dominar a
humanidade.
De surpresa em surpresa, me dei
conta que muitos censuradores, revisionistas, criacionistas e terraplanistas,
também são a favor da intervenção militar para repor o Brasil nos eixos. Para
eles, o Golpe Militar de 1964 salvou o Brasil do comunismo internacional,
instaurou a moral e os bons costumes e colocou cada um no seu lugar: os
militares para prender e matar; os capitalistas para acumular riquezas; os
trabalhadores para trabalhar; e os vagabundos prá correr. O único erro do
regime militar foi ter deixado figuras como Luiz Carlos Prestes, Miguel Arraes
e Leonel Brizola voltar ao Brasil. Ah! E outro erro dos militares foi deixar-se
influenciar pelo Golbery do Couto e Silva que achava que não havia nenhum
problema com um metalúrgico barbudo de São Bernardo que liderava as greves no
ABC. Deviam ter acabado com ele desde o início... Como não acabaram com o
metalúrgico barbudo na década de 1980 e, por intervenção do imperialismo comunista
internacional, ele chegou ao poder pelo voto do povo ignorante, foi preciso
restabelecer a ordem democrática depondo sua sucessora pelo voto democrático de
parlamentares impolutos. As malas de dinheiro na casa do Geddel e aquelas que o
Rocha Loures levou para Belo Horizonte para entregar ao Aécio, assim como os 23
milhões de dólares que o Serra tem na Suíça, isso é tudo invencionice da
imprensa esquerdista liderada pela Globo que apoiou o golpe. Só não vê quem não
quer!
Nesta Semana Farroupilha, alguns
golpistas, censuradores, revisionistas, criacionistas e terraplanistas estão
com orgulho levantando a bandeira gaúcha para afirmar que a Revolução
Farroupilha foi feita em defesa da liberdade. E que o Massacre de Porongos é
invencionice do movimento negro para denegrir a heroica imagem de Bento
Gonçalves e demais heróis farroupilhas. E que o objetivo deste movimento
revisionista é transformar os CTGs em terreiros. Neles, não mais seria feito
churrasco com carne uruguaia, mas seriam assadas as galinhas e cabritos
oferecidos aos orixás. E que os patrões e prendas seriam substituídos por pais
e mães de santos. E, no lugar da história farroupilha, as professoras dos
colégios ensinariam a história da África e da escravidão que no Rio Grande do
Sul nunca existiu porque o povo gaúcho é amante da liberdade e as charqueadas
de Pelotas são apenas um cenário cinematográfico.
Ah! Alguns gauchistas, golpistas,
censuradores, revisionistas, criacionistas e terraplanistas também acreditam
em ETs, Papai Noel, Coelhinho da Páscoa,
Bicho Papão e Cegonha. Mas isso já são outras histórias...
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