A mobilidade faz parte da condição humana. Mais: poderíamos dizer
que o que nos tornou humanos foi o fato de querer ir mais longe. Afinal, o que
impulsou nossos ancestrais a deixar de andar de quatro patas para tornarem-se
bípedes? Facilitar o deslocamento, com certeza, foi um dos fatores. De pé se vê
mais longe e o andar se torna mais ágil e rápido para buscar comida, localizar um
melhor lugar para viver, fugir dos inimigos, encontrar-se com os outros... Todas
necessidades básicas que moveram os primeiros home sapiens e a humanidade durante trezentos mil anos de história
e continuam a impulsionar, hoje, milhões e milhões de pessoas a saírem de seus
locais de origem e buscar outros espaços de vida.
De uma forma ou de outra, todos somos migrantes ou
descendentes de migrantes. De primeira, segunda, terceira ou mais gerações. É
só olhar para trás na história dos antepassados. Às vezes, basta pronunciar o
sobrenome para saber que somos migrantes ou descendentes de migrantes. O
sotaque e a cor da pele nos denunciam. Por que, então, tanta dificuldade em
aceitar os migrantes em nossa comunidade, em nossa cidade, em nosso país?
A palavra técnica para isso é xenofobia. Originada do grego,
ela significa, literalmente, o medo ao diferente. De fato, o migrante que nos
mete medo é sempre o estranho ao nosso mundo. Se é igual a nós, nem é
considerado imigrante, mesmo que tenha vindo de muito longe. Mas se a sua cor
de pele, sua língua, sua religião, sua cultura, seus costumes, são diferentes
dos nossos, as reações xenofóbicas não tardam a manifestar-se.
O que nos mete medo, não é a mobilidade, mas a presença
entre nós do diferente. Parece que isso faz parte da condição humana. Já no
tempo de Jesus era assim. Os judeus tinham muita dificuldade em aceitar quem
não pertencesse ao seu povo. O ódio aos romanos era óbvio. Roma era o Império
estrangeiro que invadiu, espoliou e mantinha sob ferrenha dominação o povo
judeu. O medo aos cananeus também, já que Israel havia se apossado de suas
terras. Já o medo aos samaritanos era menos explicável. Judeus e samaritanos
faziam parte do mesmo povo. E cultuavam o mesmo Deus. O que os diferenciava era
a presumida pureza de sangue dos judeus e o lugar de culto e alguns costumes
particulares.
Várias vezes nos evangelhos Jesus apresenta um samaritano
como modelo de fé. A passagem mais conhecida é a do chamado “bom samaritano”.
Mas existe também a passagem do leproso samaritano que, junto com outros nove
leprosos judeus, foi curado por Jesus. Dos dez, apenas o samaritano voltou para
agradecer. Só ele reconheceu em Jesus a presença salvadora de Deus. Bem
diferente dos leprosos judeus que, também curados por Jesus, continuaram
encerrados em sua convicção nacionalista e xenofóbica de que os privilégios de
Deus são exclusivamente para eles.
Curados, os nove judeus nacionalistas, ortodoxos e xenófobos
foram ao templo. Mas Deus não estava no templo. Deus estava em Jesus. E foi só
o samaritano estrangeiro, herético e longe de sua terra que o encontrou e foi
salvo por sua fé.
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