quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

Três presépios e várias questões

O Natal já passou. A Festa de Reis também. Os presépios foram desarmados e as imagens natalinas retornaram às caixas que as guardarão silenciosamente até o próximo dezembro. Na Liturgia Cristã, já entramos no tempo comum. Mas permitam-me uma pequena reflexão tardia sobre o Natal. Mais propriamente, a reflexão é sobre presépios.
Todos sabemos que a tradição do presépio foi popularizada no Ocidente por São Francisco de Assis. No ano de 1223, o Pobrezinho de Assis, fascinado pelo mistério do Deus que se faz humano tão belamente narrado nos Evangelhos de Mateus e Lucas, decidiu reviver fato tão maravilhoso. Numa gruta, na vilazinha de Greccio, relembrou a cena do nascimento criando um presépio vivo. Tomás de Celano, um dos primeiros biógrafos de Francisco de Assis, assim descreve o primeiro presépio: “A manjedoura que o Santo fez era cheia de feno e foram colocados perto dela um boi e um burro. Acima da manjedoura foi improvisado um altar e nesse cenário ocorreu a missa da meia-noite, na qual o próprio Santo (...) cantou solenemente o Evangelho juntamente com o povo simples e pronunciou um comovente sermão sobre o nascimento do menino Jesus”.
Para os que estamos acostumados com a tradição dos presépios, a cena pode parecer banal. Mas não o era para os homens e as mulheres, especialmente os que se afirmavam cristãos naqueles tempos medievais em que a Igreja se constituía como o grupo social mais rico e poderoso. Nesse contexto, a mise en scène de Francisco era provocativa: uma missa improvisada, celebrada num lugar não consagrado, com o Evangelho lido e interpretado por um leigo. E mais: num mundo em que Deus era representado como O Altíssimo, Francisco o coloca num presépio, ou seja, numa estrebaria, rodeado por bois e por burros... E todos os que fomos criados no campo sabemos das cores e dos odores de uma estrebaria.
Tomás de Celano, assim como os outros biógrafos de Francisco, não relatam as reações dos presentes naquela noite de dezembro de 1223 na Gruta de Greccio. Evadem a questão dizendo que aquele evento foi lembrado por muito tempo e se perpetuou como um símbolo da proposta genial do Santo de Assis.
Mas, hoje, quase mil anos depois, ouso imaginar que a criação de Francisco tenha provocado escândalo semelhante ao do Presépio da Diversidade criado pelo artista plástico paulista Luciano de Almeida. Nele, o artista coloca, junto com as tradicionais figuras da cena, uma prostituta, um casal homossexual, um portador de HIV, um cadeirante, um casal de idosos e vários meninos de rua. Mesmo tendo sido anteriormente exposto em São Paulo, na Alemanha e na Itália, tal montagem provocou grande celeuma nas redes sociais. Grupos fundamentalistas cristãos e movimentos sociais ultraconservadores clamaram contra a presença na cena natalina de um casal homossexual. A pressão foi tanto eu frei Roger Brunório, curador da exposição, teve que retirar o presépio da exposição antes que algo de mais grave acontecesse.
Enquanto isso, vários sites da “grande imprensa” tradicional brasileira anunciavam “presépios de cãezinhos” como “a coisa mais fofa que você verá neste Natal”. Várias imagens ilustravam as chamadas para os “novos presépios”. Nelas, no lugar de Maria, José, os Magos e Pastores, cães e cadelas devidamente ornados com trajes orientais. E, no meio da cena, no lugar do Menino Jesus, um filhotinho deitado numa manjedoura. E o mais surpreendente: nenhuma crítica a tais representações por parte dos cristãos e católicos fundamentalistas e dos grupos conservadores de direita que se pretendem defensores da moral e dos bons costumes!

Três presépios e uma pergunta: a quem os moralistas defendem? Será que Francisco de Assis se sentiria representado pelos presépios que hoje são feitos nas Igrejas, praças públicas, lojas e shopping centers? Ou, se estivesse por aqui hoje, não procuraria uma outra Greccio para reinventar a tradição de Natal? Talvez as favelas, os viadutos, as zonas de prostituição fossem o único lugar onde ele encontraria gente disposta a acreditar que Deus se fez humano e está presente em cada pessoa marginalizada. Inclusive nos casais homossexuais expulsos do presépio pelos puritanos e moralistas. Bem dizia Jesus: “As prostitutas e os publicanos vos precederão no Reino dos Céus”. A prova disso está no próprio presépio: prostitutas e publicanos ali nos precederam!

Ordem e Progresso

Mesmo os críticos mais acerbos do golpe de 2016 temos que reconhecer: a economia está retomando! A mudança é claramente perceptível. Só não enxerga quem não quer.
Mesmo se os dados de todos os telejornais abundantemente irrigados pela propaganda governamental não bastassem para nos convencer disso, uma pequena volta pelas ruas, avenidas, praças e parques de qualquer cidade de médio ou grande porte, maiormente as capitais, é suficiente para nos abrir os olhos à nova realidade de estabilidade e crescimento econômico.
Tomo o exemplo de Porto Alegre. Na esquina da Ipiranga com a Azenha, só havia um rapaz que limpava os para-brisas dos carros. Agora já são dois. 100% de aumento da força de trabalho ocupada! Impressionante mesmo para o mais cético dos economistas. E além dos dois, agora há uma senhora que vende água. E um quarto que faz malabarismos e, em troca, pede gentilmente uns trocados. Em frente à UFRGS, um senhor vestido de palhaço dá, diariamente seu show de pirotecnia e equilíbrio. Antes da crise, ele só trabalhava das 17 às 22h. Agora, com a retomada da economia, ele aí está labutando das 8h da manhã às 23h.
No portão do Banrisul da Avenida Bento Gonçalves, um jovem senhor oferece abacaxi com a opção de inteiro ou em fatias. Isso que ele não é um empreendedor individual. Ele é empregado. E, como a nova legislação trabalhista permite, seu trabalho é intermitente. Só trabalha quando as condições climáticas são ótimas. Em outras palavras, nos dias de chuva, ele não trabalha. Isso só foi possível porque agora já não há, nas negociações trabalhistas, a nefasta interferência dos sindicatos.
E o mais interessante é que o novo espírito econômico começa a vencer os vícios do estado protetor e provocador da inércia. Exemplo deste novo espírito econômico, é a notória quantidade de pessoas que já não esperam pelas benesses do Estado na forma do Minha Casa Minha Vida e, com muita iniciativa e criatividade, fazem das praças, viadutos e marquises seu lugar de moradia. Em alguns pontos há verdadeiros conjuntos habitacionais que renovam a paisagem urbana.
Também no âmbito comercial, no centro de Porto Alegre então, a retomada é fantástica. Em cada esquina e sob cada marquise, verdadeiros shopping centers onde encontra-se de tudo. Pena que o prefeito Despacito Júnior, tão liberal em suas ideias econômicas, teime em querer controlar a livre iniciativa que aos poucos vai demonstrando sua superioridade em relação ao Estado opressor. Não entendo o porquê de, de tempos em tempos, ele jogar sua guarda pretoriana sobre os empreendedores individuais que exercem o comércio nas ruas e praças da capital gaúcha.
Ah! E não podia, é claro, esquecer que a educação empreendedorista está também mostrando seus resultados nas inúmeras crianças que, livres da ideologia que as prendia à tutela do Estado em matéria de educação, alimentação e lazer, lançam-se às ruas e põe-se a labutar para ganhar a própria sobrevivência. Eles não esperam por seus pais inaptos e dependentes das leis trabalhistas. Com 8, 10 ou 12 anos já andam pelos semáforos pedindo um suporte e econômico para suas atividades empreendedoras ou então exercendo o pequeno comercio de todo tipo de mercadoria, desde as importadas da China até a do próprio corpo, para educar-se no espírito empreendedor.
Estamos avançando. É um novo país que se desenha. Viva a nova economia! Viva a liberdade de mercado! Viva o espírito empreendedor! Viva a ordem e o progresso!

Propósitos, planos e projetos

Fim de ano é tempo de propósitos e planos. Tem o fulano que decide parar de fumar. Já o sicrano jura que vai largar sua vida sedentária e incorporar nos seus hábitos uma caminhada diária. O beltrano garante que vai parar de comprar no cartão de crédito. Este afirma com certeza que não vai faltar à missa nos domingos. Já aquele promete que trabalhará um pouco menos para passar mais tempo com os filhos. Cada um com seu propósito. Geralmente muito delimitado e, em princípio, exequível, de curto prazo e mensurável. Quantos conseguirão? A experiência diz que muito poucas pessoas conseguem, de fato, realizar seus propósitos de final de ano... E não é de estranhar. É da própria natureza do propósito que se fundamenta mais na emoção que na razão. Provavelmente os mesmos propósitos serão refeitos no próximo final de ano para não serem executados outra vez.
E há os que fazem planos. Estes pensam a mais longo prazo e se perguntam: o que quero para o final do próximo ano? Onde e como quero estar? Elaborar planos é uma tarefa mais lenta e mais difícil e que vai para além de um final de ano. E mais: os resultados de um plano são, no imediato, menos delimitáveis e tangíveis. Fazer um plano implica em mais trabalho. Estabelecer uma meta, estratégias, atividades, recursos... Muito mais difícil. Por isso menos gente faz planos. Mas, sem que isso seja contraditório, proporcionalmente, quem faz planos tem mais possibilidade de êxito do que quem faz propósitos. O planejador é menos emocional, menos volúvel e mais persistente.
Mas existe um passo que vai além de propósitos e planos. Existem os projetos. E estes ultrapassam a dimensão dos propósitos e dos planos. Um projeto sempre é de longo prazo. Ultrapassa os limites do calendário anual e implica uma decisão de vida. Não se pergunta por onde e como quero estar no final do próximo ano. O projeto exige pensar onde e como quero estar no final desta vida. Ele exige a combinação de diferentes planos convergentes com o fim estabelecido.
Claro: a execução de um projeto implica na elaboração de  planos com a sua racionalidade que por sua vez começa sua implementação com um propósito que só se realiza com a emocionalidade. Um não descarta o outro. Pelo contrário. Exige uma combinação.
Comecei a rabiscar estas reflexões a partir de duas situações que me preocupam. A primeira é a que me ponho como cidadão brasileiro. Depois do 2017 que tivemos e das falas de final de ano das autoridades – executivas, legislativas e judiciárias – tanto no nível federal, como estadual e municipal, a pergunta que me vem é: qual é o projeto que rege os planos e propósitos para o próximo ano? Enquanto cidadãos desta terra brasilis, teremos, no próximo ano, que viver de propósitos ou é possível ter planos e projetos?
A outra preocupação é a que me ponho como cristão, membro da Igreja Católica Romana e profissional do ensino teológico. Depois de um 2017 em que a oposição ao Papa Francisco apareceu de forma articulada e agressiva, é possível sonhar com um projeto de uma “Igreja em saída” para as periferias sociais e existenciais ou teremos que nos contentar com planos e propósitos de curto prazo? Acontecerá com a primavera do Papa Francisco o mesmo que aconteceu com a primavera do Papa João XXIII? Além dos propósitos que se movem pela emoção, há um plano e um projeto de real e radical transformação eclesial?
São preocupações que levo comigo para estes últimos dias de 2017 e espero possamos juntos pensá-las em 2018 e por muito tempo mais.
Feliz Ano Novo!

quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Mercado em recuperação

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