Há
muitas formas de sair de cena. Há aquela bem educada em que se pede licença,
despede dos presentes e toma o rumo da porta abanando para os que ficam.
Há
a saída à francesa: de fininho, sem
que os presentes se deem conta. Pode ser falta de respeito. Ou pode significar
discrição, desejo de não atrapalhar a alegria e a festa que segue.
Há
a saída estrepitosa daquele que sai causando.
É o correlato do chegar chegando,
fazendo barulho, chamando atenção para ser notado e se impor aos demais.
Também
há a saída forçada, não desejada, resistida, daquele que quer ficar, mas é
expulso, jogado para fora, de forma violenta ou com subterfúgio. E há a saída
disputada em que alguns querem que a pessoa permaneça e outros querem excluí-la.
E
há a saída não realizada, a saída incompleta, não acabada, inconclusa, não
finalizada em que a pessoa que sai, mesmo que não mais esteja, continua
presente. E, se procuramos por ela, mesmo que não a vejamos, sabemos que aí
está. Esta é a saída mais dolorosa. É a que mais dói porque nunca termina. É
uma saída no particípio presente. Essa forma verbal que na língua portuguesa
deixou de ser ação e passou a ser qualidade da qual ninguém pode desimpregnar a
quem foi com ela marcado.
É
a saída dos mortos que nunca morrem. Seja porque não pudemos deles nos despedir
de forma digna e respeitosa, como acontece hoje com os mortos por Covid19,
subtraídos ao carinho e pranto dos familiares e amigos antes mesmo do último
suspiro e enterrados às pressas em uma vala anônima. São os povos indígenas
que, desde a chegada dos europeus até hoje, continuam sendo desaparecidos
contra a sua vontade e, para não deixar em paz a consciência dos que os matam,
continuam teimosamente a resistir com sua incômoda presença. Ou os presos,
torturados e mortos pelas ditaduras e que tiveram seus corpos desaparecidos,
mas sua memória está viva naqueles e naquelas que seguem seu sonho de uma
sociedade justa, fraterna e feliz.
E
há os mortos que nunca morrem porque sua existência foi de tal modo intensa que
já não cabia somente neles. E a vida que eles carregavam e repartiam se
expandiu e tomou conta de todos aqueles e aquelas que com eles tiveram a graça
de conviver.
É
dessas vidas que dizia Dom Oscar Romero: “Se me matam, ressuscitarei na vida do
povo”. Não era uma frase vã ou pretensiosa. Pelo contrário: era o humilde
reconhecimento de que, aquele que foi morto, ressuscitou e já não está presente
como antes, continua vivo no meio de nós. Ele subiu aos céus, mas sua presença
esperançadora é maior e mais forte que todas as ausências. E Sua vida, que vive
em nós, nos impulsa a seguir fazendo o que Ele fez.
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